O Brasil só se reencontra consigo mesmo quando encara essa verdade. E, como veículo, acreditamos que essa conversa não pode ser adiada.
Editorial — O 20 de novembro não é apenas um marco no calendário. Ele funciona quase como um espelho colocado diante da sociedade brasileira. Um espelho que nos obriga a encarar o que preferimos varrer para baixo do tapete. A data, tornada feriado nacional em 2011, homenageia Zumbi dos Palmares e, junto a ele, Dandara. Mais que figuras históricas, são símbolos. Representam a insistência da vida negra em existir, resistir e pensar caminhos de liberdade em meio a um sistema construído para negá-la.
Quando revisitamos a trajetória do Quilombo dos Palmares, percebemos que a resistência não era apenas militar. Era também filosófica. Era um projeto de mundo. Zumbi e Dandara defendiam a ideia radical de que pessoas negras podiam ser sujeitos plenos, criar comunidades autônomas, viver sem correntes. Essa noção, tão simples e ao mesmo tempo tão revolucionária, segue ecoando hoje, especialmente nos debates sobre racismo estrutural. Porque o racismo não desapareceu com a abolição, ele apenas mudou de estratégia, disfarçou-se em números, políticas mal distribuídas, oportunidades que nunca chegam para todos.
O Dia da Consciência Negra nos convida a encarar essas permanências. A desigualdade racial continua pulsando no acesso à educação, na distribuição de renda, na marginalização da juventude negra, na sub-representação política. E quando olhamos para figuras como Luís Gama ou Luísa Mahin, vemos que a nossa história sempre teve intelectuais, lideranças e pensadores negros que apontaram saídas. O problema nunca foi ausência de caminho, mas falta de disposição da sociedade para segui-lo.
Por isso o 20 de novembro é mais que celebração. É um dia para pensar criticamente o país que construímos e o país que ainda podemos construir. Por todo o Brasil, rodas de diálogo, atividades culturais e encontros comunitários lembram que consciência não é um estado, é um processo. Um exercício contínuo de olhar o passado, reconhecer o presente e ousar imaginar um futuro mais justo.
O Brasil só se reencontra consigo mesmo quando encara essa verdade. E, como veículo, acreditamos que essa conversa não pode ser adiada.
